domingo, 2 de fevereiro de 2014

Do jeito mais difícil


Certa vez, uma senhora resolveu observar o estranho comportamento do filho e nada entendia, ele comia desesperadamente faminto, como se passasse fome isolando-se dos amigos e não queria ir à escola, achava que todos estavam contra ele, ou falando mal dele, na verdade, estava alucinado, sempre ausente, o seu eu havia desaparecido completamente ao começar o uso de drogas.
A cada dia que passava o filho da pobre mulher, dona Maria se tornara agressivo, maltratando até mesmo o cãozinho, seu fiel amigo de infância que sofria esquecido.
Este filho único e ainda era um menino de pouco mais de quatorze anos, mas que dava trabalho de gente grande, chegando de madrugada ou nem dormindo em casa.
Enquanto lá fora cabisbaixo o cãozinho ia farejando até encontrá-lo drogado e caído no fundo do quintal e ali passava a noite ao relento não estava lúcido o suficiente para entrar e dormir em sua cama enquanto a sua pobre mãe passava noites em claro a sua espera e lhe preparara a cama com carinho com esperança de chegasse logo.
E então o cão latia insistentemente chamando a atenção da Senhora para encontrar o filho que por sinal babava feito cachorro louco e sujo como um porco no quintal.
Ela tentava leva-lo, mas era inútil, era pesado demais e alto demais, ele não trabalhava e só dormia trocando a noite pelo dia, já a coitada trabalhava para sustentá-lo.Na maioria das vezes ele comia tudo, é claro que ela fingia que já havia se alimentado para que sobrasse para o filho, afinal ele nunca estava sóbrio o suficiente para saber se a mãe já tivesse se alimentado ou não.
Ao passar na rua se envergonhava em ouvir os comentários sobre ele, tanto do filho quantos dos outros, pois o filho dela era um deles, um dos jovens que se matavam um pouco a cada dia se drogando nas esquinas da vida.
O tempo foi passando e os comentários foram aumentando...
Agora não era apenas um bando de meninos rebeldes, passaram a ser chamados de infratores, pois todos tinham passagem pela policia incluindo o filho da pobre mulher que não deixou de ir a uma só visita ao filho no presídio de menores com sol ou chuva.
Vendeu seus pequenos pertences domésticos que havia adquirido com o suor do trabalho escravo em casas de famílias.Passava noites e noites chorando até conseguir dormir pensando no filho que ficara ao léu na cadeia a mercê dos outros detentos.Amanhecia e ela estava feliz por Deus ter lhe dado mais um dia de vida para visitar seu amado filho.
Mas para chegar até ali precisou sair catando latinhas de alumínio caminho a fora e no ferro velho vendia e no supermercado gastava com satisfação de levar para ele, e encarava um sol escaldante na fila quilométrica da penitenciária com um sorriso discreto no rosto, mas nos olhos quanta tristeza.Seu rosto marcado pelo sofrimento, apesar da pouca idade que tinha não se importava com vaidade tinha sempre o filho em primeiro lugar.
Depois de ficar horas e horas na fila passou pela revista feminina, que humilhação, mas nada abalava a vontade de ver o filho mais uma vez e repetia pra si mesma, vale a pena.
As promessas de que tudo ia ser diferente quando ganhasse a liberdade iludiram o coração de açúcar daquela mulher, mas depois de receber a visita, as frutas, biscoitos, que eram misturados de qualquer jeito e produtos de higiene eram revirados, se não fosse exigida esta rigorosa revista, algumas companheiras e mães levariam drogas e celulares para os filhos.
Depois da visita ele se juntava aos outros para contarem os seus desacertos, com roubos e homicídios, cada cem presos, poucos se arrependem e voltavam a ter uma vida normal, na cela oito não se sabe quem era o melhor ou pior.
Lá dentro os dias apenas passam um após o outro, igual o outro a não ser em dias de visitas ou de rebeliões.Um dia lá dentro para eles era como se fossem três e assim por diante.
Ali se chorava e mamãe não escutava.
Já o filho de dona Maria, ao ser liberto, ficou arredio com o mundo e quis descontar em todos que via pela frente, como se o mundo fosse culpado por sua péssima escolha de ser mais um nas estatísticas do “crime”.
De infrator do código 157 (Assalto a mão armada), passou a ter nome de assassino, já havia perdido as contas de quantas vidas apagou com as próprias mãos.
Andava fortemente armado e tinha medo da própria sombra, qualquer barulho saía atirando,  no bairro ele era o tal o terror da vila e não fazia questão de esconder.
Sua mãe decepcionada já não sabia o que fazer, pensou ter chorado todas as lágrimas que tinha nos olhos, perdeu o emprego e junto à vontade de viver. Já não fazia comida nem cuidava da casa, mas também não recebia visitas, foi ignorada pela vizinhança.
Ele não percebia a bagunça da casa muito menos a tristeza nos olhos da mãe que com muita dor lhe dera a vida e ainda pode sorrir ao pega-lo no colo pela primeira vez.
A vida inteira fez das tripas coração para criá-lo para não deixar passar fome, deu carinho enquanto quis receber, ou seja, até achar mico ficar debaixo das asas da mamãe. Pai nunca viu desde que se entende por gente não tivera o prazer de conhecê-lo, talvez nem exista, se tiver uma índole parecida, seria familiar. Sua mãe então se sentou perto do filho totalmente nóiado, pensando no que poderia fazer para ajudá-lo, pois havia feito de tudo sem sucesso algum decidiu então tirar a vida do próprio para impedi-lo de fazer atrocidades e outras mães sofrerem ao perderem seus filhos pelo mesmo motivo “drogas”.Se lhe deu a vida sentiu-se no direito de tirá-la.
Mas suas lágrimas caíram como gotas de fogo em cima do lençol branco o qual seu filho deitava, ao caírem parecia sangue, ao mesmo tempo saíam fumaça, mas ela não poderia ver as gotas, pois estava cega pelo amor incondicional pelo filho.
Apanhou uma arma que estava expostas e tremia a mirá-lo como alvo, ela não seria capaz era apenas uma mãe. No entanto saiu às presas e jogou a arma no lixo enquanto o drogado dormia um sono profundo e então continuou pensando no que poderia fazer por ele, mas seu estoque de idéias havia acabado fazia tempo.E continuou ali olhando e chorando quando o viu em delírios planejando matar o vizinho, um bom rapaz, ex amigo de infância que apenas aconselhava os outros que desviram seus caminhos a saírem do crime. Coitado acabou entrando em vespeiro sem saber, pois quando se chega a esse ponto não se ouve conselho, pelo contrario eles se vingam  dos outros pelo simples fato de ser diferente, do bem. A pobre mãe ficou horrorizada ao ouvir tamanha barbaridade. Desta vez era diferente, ela sabia quem era a próxima vitima e poderia intervir, só não sabia como. Foi imediatamente às autoridades pedir ajuda, não para o seu filho que já estava perdido demais para ser resgatado, não foi ouvida, não estava preparada fisicamente para ser recebida por um delegado, tinha vestes comum demais para serem despercebidas, mas ela insistia em pedir proteção para o bom vizinho, o tal rapaz jurado de morte. Ficou ali ignorada por tanto tempo que resolveu ir embora, pois o filho armara uma cilada para um inocente e ninguém queria acreditar nela.                                                      
O filho dela pediu que o rapaz que fosse lá às oito da noite para conversarem mentiu que estava arrependido e queria ouvir o que o Deus dele tinha para falar com ele. Com certeza o rapaz ficaria feliz e acreditaria deu sua palavra de que estaria  lá na hora marcada. Tudo estava planejado, duas armas polidas que chegava brilharem com o sopro dele e bem carregadas, treinou como seria passo a passo, repetindo varias vezes que teria que agir rápido colocou o silenciador e não admitia de si mesmo nenhuma falha. A estas alturas ele não andava mais drogado, fazia seu crime friamente lúcido por puro prazer de vingar-se de quem resistiu ao caminho errado e esperou...
O relógio rodava de lá para cá, a ansiedade lhe corruía por dentro como uma soda cáustica.
Sua mãe foi até a casa do jovem com intuito de impedi-lo de ir ao tal encontro, mas era tarde não havia ninguém em casa naquela noite. Ela estava com um aperto no coração por ter as mãos atadas, sentindo-se totalmente inútil.
Como o rapaz era amigo de infância tinha intimidade para entrar sem bater como de costume antes do filho entrar no crime. Não teve alternativa e foi embora. Quando a porta se abriu, o filho descarregou as duas armas em cima do pobre rapaz sem nenhum pudor e ainda teve tempo de gargalhar-se.Ao ascender à luz viu sua mãe esticada no chão com tantos furos no corpo que mais parecia uma peneira, ele se abaixou e pela primeira vez se viu em total desespero.
Será por ter acabado com a vida da sua escrava que lhe fazia tudo?
Será que de desespero por não saber onde jogar o corpo ou por medo de não sair ileso desta vez?
Não, nenhumas destas hipóteses estavam certas.
Os olhos da mãe ainda abertos, ela não gritou, foi forte o suficiente para aguentar firme, não a dor da carne, apesar de ensanguentada, a de saber que foi o próprio filho que cometesse a atrocidade, era como uma dor de parto, uma dor sem lagrimas que são rolam quando o bebê nasce, deixou rolar apenas uma lágrima transparente, mas não era uma lágrima comum, sangue invisível por isso o filho não podia ver.
Ao abraçá-la sentiu um volume no bolso do velho vestido, reteu suas lágrimas e apanhou o bilhete que mal conseguia lê-lo, parecia que o coração dele ia sair pela boca, mas conseguiu, ele era apenas um homem, nunca poderia saber o que se passa no coração de uma simples mãe.
As maltrassadas linhas diziam assim:
“Filho fiz o que pude e não consegui impedi-lo de ser este monstro, eu preferi mata-lo e acabar de vez com tudo isso, mas não fui capaz de fazer tamanha crueldade com um pedaço de mim, a culpa é minha, eu o coloquei no mundo, para trazer alegria para mim e para as pessoas que gostavam de você, mas não é isso que tem acontecido. Resolvi dar cabo da  minha própria vida, tapar os olhos para não ver os seus erros. Mas que Deus um dia possa nos perdoar, eu te amo assim mesmo meu filho, mas, adeus.”
Ele apanhou sua mãe nos braços e saiu correndo e gritando pedindo socorro queria insistir consigo mesmo de que ela sobreviveria, mas no fundo, no fundo ele sabia que ninguém saía ileso de uma rajada de balas nem mesmo uma supermãe.
Só hoje ao estar consciente pôde perceber isto, era tarde, muito tarde...
Com loucura saiu aos berros chamando atenção dos vizinhos, a policia chegou ele se entregou com uma condição, apesar de não poder nada exigir, foi ouvido e antes velar a mãe ainda assim foi algemado. Ele era o único parente, mas no velório não foi o único ela tinha muitos amigos que se afastaram por causa dele, mas inconformados com a brutalidade acompanharam o cortejo lamentando ainda desacreditados em todo o caminho.
Logo após o funeral entrou na viatura e retornou ao presídio, ficou em estado de choque sentando no chão da cela oito. Não comia, não falava, apenas via nem se quer ouvia, cruzou os braços pra vida.
Um dia recebeu uma única e inesperada visita, aquele jovem o ex amigo, o bom vizinho que veio lhe explicar o porquê não pôde aparecer no dia combinado.
Disse que na noite do encontro atendeu a um chamado de ultima hora, foi convidado para pregar na igreja no lugar do pastor Alcides que havia se ausentado de emergência ele não pôde recusar. Explicou também que os vizinhos viram a mãe dele gritando tentando avisa-lo de alguma coisa, parecia premeditar que algo terrível lhe aconteceria, mas ele não estava em casa.
E deixei até um bilhete para você na porta da sua casa, mas depois que tudo aquilo aconteceu encontrei o bilhete no mesmo lugar.
O bom rapaz que não entendia mais nada fechou os olhos e fez uma oração interna e silenciosa, enquanto o preso só chorava sem dizer uma só palavra...
 Sem enxugar as próprias lágrimas o órfão foi explicando aos balbucios:
Naquela noite você era o alvo, você era o alvo! Não a minha mãe era você! Você entendeu?
 Minha mãe já estava cansada de viver resolveu se suicidar, achei uma corda pendurada na cozinha para se enforcar, mas antes passou na sua casa para impedir que não fosse lá em casa, que era uma armadilha e pelo silencio ela pensou que eu já havia saído e foi entrando, eu pensei que ela fosse você e fui logo atirando.Se esse é o preço para eu me mudar de vida por aqui devo começar.E este Deus que lhe salvou da morte eu também, quero conhecer, por favor me apresente a ele, não tenho saída.
Ali mesmo diante da bíblia aceitou Jesus como seu único salvador no meio de tantos, ajoelhado, não se envergonhou.
Pagará os seus crimes com anos e anos de prisão, entravam presos e saíam presos e ele ali em sua missão, um porta voz de “Jesus” falando para todos que, não era preciso esperar as coisas piorarem para encontrar a salvação, se nem todos podem ter a chance de sair vivo das drogas ou da prisão. 

“Entrai pela porta estreita, por que larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz a perdição e muitos são os que querem entrar por ela. Porque estreita é a porta e apertado é o caminho que leva a vida e poucos a que a encontrem”... (Mateus 7:1).


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